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sábado, 25 de agosto de 2018

O LIVREIRO / Monteiro Lobato

O LIVREIRO

     Entre os mais humildes comerciais está o livreiro. Embora sua mercadoria seja à base da civilização, pois que é nela que se fixa a experiência humana, o livro não interessa ao nosso estômago nem a nossa vaidade. Não é, portanto compulsoriamente adquirido. O pão diz ao homem, ou você me compras ou morre, o batom diz à mulher: ou me compras ou te acharão feia. E ambos são ouvidos. Mas se o livro alega que sem ele a ignorância se perpetua, os ignorantes dão de ombros porque é própria da ignorância o sentir-se feliz em si mesma como o porco em sua lama.
       O livreiro vende o artigo mais difícil de vender-se. Qualquer outro artigo lhe daria mais lucros ele o sabe e heroicamente permanece livreiro. E é graças a essa abnegação, que a árvore da cultura vai aos poucos aprofundando as suas raízes, e dilatando a sua fronde.
      Suprima-se o livreiro estará morto o livro e com a morte do livro retrocederemos à idade da pedra, transfeitos em papuias comedoras de bichos de pau podre.
     A civilização vê no livreiro o abnegado zelador das lâmpada em que arde, perpetua a trêmula chamazinha da cultura.

                                                                        Monteiro Lobato. 

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